Parto domiciliar divide opiniões entre médicos e mães
Cada vez mais procurado, o
parto humanizado é um conceito de dar à luz da maneira mais natural possível.
Trata-se de um parto feito num ambiente harmônico, com o mínimo de intervenção
externa, no entanto, ainda não existe definição protocolar para esse
procedimento.
O parto domiciliar já foi
a opção mais segura para as mulheres. Na Europa de até meados do século 19, os
médicos não conheciam conceitos, nem a importância, de procedimentos como a
assepsia e era comum que manipulassem enfermos, cadáver e logo depois
realizassem um parto. Nessas condições, os índices de mortalidade em geral e
também dos recém-nascidos era alto.
Depois da revolução pela qual a medicina passou no século 20, hospitais
tornaram-se lugares mais seguros e indicados para o nascimento de crianças. No
entanto, muitas mulheres defendem o parto à moda antiga, dentro de casa.
Algumas famosas como
Gisele Bündchen, Juliana Knust e Daniele Suzuki também optaram pelo parto
humanizado afirmando resgata o direito da mulher de escolher o que será melhor
para ela e seu filho, sem ter que simplesmente aceitar as regras dos médicos e
hospitais.
As mulheres que optam por
esse método se sentem realizadas, no entanto, na hora de seguir o exemplo das celebridades,
os cuidados básicos com saúde da criança e da mãe não podem ficar de fora.
Qualquer mulher que tome essa decisão deve estar em dia com os exames
necessários e ser acompanhada por médicos.
No Brasil, o parto
domiciliar não é recomendado pela Federação Brasileira das Associações de
Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) e pelo Conselho Regional de Medicina de
São Paulo (Cremesp), por causa do risco à mulher e ao bebê.
Para as mulheres que
decidem, ainda assim, dar à luz à moda antiga, é necessário um pré-natal bem
feito e com acompanhamento adequado, infraestrutura mínima, condições de
transporte de urgência e preparo do profissional que vai acompanhar o parto,
seja eles, uma enfermeira ou um médico.
Em entrevista com Letícia
Schimidt Arruda, mãe, doula e organizadora do grupo Ishtar de Sorocaba, o Folha
da Cidade esclarece algumas curiosidades sobre o parto domiciliar.
FOLHA - Quais são as
vantagens do parto em casa?
LETÍCIA - Eu acho que a maior vantagem é estar num local
conhecido, familiar, onde você pode escolher desde a assistência, pessoas que
estarão com você, o que deseja comer ou beber, até o tempo que o bebê ficará ao
seu lado e quando dar o primeiro banho. Além disso, no último estudo sobre a
segurança do parto domiciliar comprovou que o grau de satisfação materna é
aumentado em relação ao parto hospitalar.
Acho importante ressaltar
que os estudos mais recentes, publicados em 2011, o do National Health
System (NHS) no Reino Unido e outro estudo holandês com mais de 679.000
partos mostram a segurança do parto domiciliar. Nesse último estudo,
evidenciou-se uma mortalidade perinatal de 0,15% em partos domiciliares
planejados contra 0,18% em partos hospitalares planejados em parturientes de
baixo risco. Como diz a camiseta que minha filha usou na marcha do parto em
casa: “Eu nasci com segurança amor e respeito. Eu nasci em casa”. Acho que essa
frase já diz tudo.
FOLHA - Quais medidas
você teve que adotar para realizar o parto domiciliar?
LETÍCIA - Eu fiz o pré-natal normal, com exames, ultrassono-grafias,
consultas regulares e ao final da gestação estava tudo ok, ou seja, era uma
gestação de baixo risco o qual eu podia escolher onde ter o bebê. Então, optei
pelo parto em casa. Foi necessário escolher assistência, definir um plano B
(mesmo o parto ocorrendo em casa, precisa ter escolhido um hospital próximo
para transferência, se necessário), manter a casa limpa e organizada (separei
comida, toalhas de banho, roupa de cama, lençol descartável) e esperar o grande
dia.
FOLHA - Como foi o
nascimento da sua filha?
LETÍCIA - Eu conheci a opção do parto domiciliar quando estava
grávida da minha primeira filha, que hoje tem 5 anos. Mas não tive tempo de
amadurecer a ideia, e estudar os riscos e benefícios. O primeiro nascimento foi
uma experiência legal, porém fui separada do meu bebê, ela não pôde mamar na
primeira hora, eu não a vi direito assim que nasceu pela rapidez com que ela
foi levada, isso me levou a questionar mais a fundo o porquê do parto
domiciliar.
Em dezembro de 2007 fiz o
curso de doula (mulher que auxilia outras mulheres na gestação, parto e
pós-parto) e acompanhei alguns partos em casa, todos planejados, com
assistência profissional e todos tiveram excelentes resultados.
Quando eu engravidei da
segunda filha, o parto em casa foi minha primeira opção. Fui acompanhada e
contratei uma equipe para vir me atender em casa. Era uma obstetriz e uma
médica neo-natologista, além de uma doula. Minha filha nasceu de um parto
muito tranquilo e intenso, no chuveiro da minha casa e foi aparada por mim e
pelo meu marido. Permaneceu no meu colo durante toda avaliação, mamou e
conheceu a irmã em seguida, o que tornou nosso momento ainda mais especial.
Depois de algum tempo brindamos a chegada da pequena na família junto à equipe,
foi um dia muito emocionante, um evento familiar!
FOLHA - Considerações.
LETÍCIA - O grupo Ishtar existe para a troca de informações e
experiências, que podem ser obtidas no ishtarsorocaba.blogspot.com. As reuniões
acontecem quinzenalmente e são gratuitas.
MARCHA - No domingo, 17 de junho, mulheres de diversas cidades
do Brasil foram às ruas para lutar por um direito. Elas querem poder escolher
onde vão dar à luz.
O movimento Marcha do
Parto em Casa ganhou força depois que o programa Fantástico, exibiu uma
reportagem sobre o tema onde o obstetra Jorge Francisco Kuhn defendeu o parto
domiciliar para mulheres saudáveis que realizaram um pré-natal completo com o
acompanhamento de um especialista. Porém o Conselho Regional de Medicina do Rio
de Janeiro (Cremerj) pediu ao Cremesp, uma punição para o obstetra.
Para Letícia Arruda
participar da Marcha do Parto em Casa foi muito especial, “foi um manifesto
nacional, que aconteceu em mais de 23 cidades brasileiras. Apesar do nome, a
marcha não era pelo parto em casa e sim pelo direito de escolha das mulheres.
Eu acho que toda mulher deve ter acesso real à informação e decidir o que é
melhor para ela e para o bebê. Uma marcha pela liberdade e pelo respeito a
todas as mulheres! Muitas ainda são desrespeitadas, sofrem violência obstétrica
e acham normal! Espero que com o assunto na mídia, uma parcela da sociedade ao
menos pense sobre o assunto”, salientou.